Nũmio Kihtí: Recordar é Viver, é resistir!
Nũmio Kihtí: Recordar é Viver, é resistir!

Nũmio Kihtí: Recordar é Viver, é resistir!

Nũmio Kihtí: Recordar é Viver, é resistir!


No interior de São Gabriel da Cachoeira, na Comunidade Maracajá, conhecida por Tuóñariyoã, Distrito de Pari Cachoeira (Imí Sapoeá), Rio Tiquié (Kihsá  Ma’a), foi onde nasci, a terceira filha da união de Ahkutó (Antônio dos Santos Moura) e Yuhsuró  (Elza Maria Moura Fernandes), as onze horas do dia 27 de Abril de 1993. Neta de Ku’marõ (Sebastião Moura), pertencente da etnia Tukano e Miriõ (Marcelina dos Santos), da etnia Desana e avós maternos, Diakuru (Américo Fernandes), Kumu da etnia Desana, e Yusió (Maria Moura), pertencente da etnia Tukano. Sou Pirõdyhó, integrante da família Dipéporõ (Família Moura), grupo étnico Ñamiri Mahsã, conhecidos por Dahséa, etnia Tukano. No dia 12 de dezembro de 1995 meu pai veio a falecer, seu falecimento marcou a grande mudança em minha vida, pois, o mesmo planejava com minha mãe migrar da comunidade para a sede, São Gabriel da Cachoeira, em busca de uma vida melhor e educação escolar para os filhos. Viúva, com três filhos e gestante de mais um, continuar na comunidade trazia seus obstáculos para a minha mãe, as condições não eram propícias para sua permanência, logo que em um local, no qual a sobrevivência depende de grande esforço físico: caça, pesca, derrubada de roça, cultivo de mandioca, por tanto, após o ocorrido com meu pai, ela decidiu ir em busca de realizar o desejo planejado por eles. 

Em janeiro de 1996, saía do interior juntamente com meus irmãos e minha mãe para se estabelecer em São Gabriel da Cachoeira. No ano seguinte, na Escola Thiago Montalvo, deu-se início a minha vida escolar, em casa a mãe ensinava o que sabia para completar o ensino. Nesta instituição, permaneci durante três anos, no qual, o primeiro ano foi cheio de desafios, as atitudes que meus colegas de aula tinham comigo, o racismo e o preconceito por ser indígena e falante se fez presente no dia a dia das aulas, risadas durante a minha fala, apelidos maldosos, objetos arremessados são as duras lembranças guardadas na memória e que teve por consequência a inibição ao uso da língua materna, para que assim fosse “aceita” nesse meio. No ano de 2004 a 2007, no Colégio São Gabriel, as disciplinas de Língua Portuguesa, Geografia, História, Artes procuravam direcionar à importância da cultura indígena de São Gabriel da Cachoeira, tudo isso, devido a Lei 145/2002, em 22/12/2002, no qual foi oficializado as três línguas indígenas, Tukano, Baniwa e Nheengatu. Foi nesse período que a indagação do abandono da língua materna começou a florescer.

Ingressar no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Gabriel da Cachoeira, era um sonho alcançado por poucos, no ano de 2008, esse grande sonho, foi realizado, pois, dentre vários alunos fui aprovada em terceiro lugar. Na instituição obtive grandes experiências, como: fazer parte da Organização do Evento da Feira Agricolina e a Semana de Ciência e Tecnologia, Projetos de pesquisa, dentre outros. Nessas ocasiões, conheci pessoas que instigavam o autoconhecimento, pessoal e social, bem como, valorizar a cultura que me rodeava, além da figura principal, minha mãe e o meu avô, Diakuru, autor/narrador do livro Desana “A Mitologia Sagrada dos Desana-Wari  Dihputiro Porã” e “Bueri Kãdiri Maririye: Os Ensinamentos que não se esquecem. Sentada ao redor da mesa, ouvindo minha mãe, Elza Maria, Desana, contar como era ser interna das missões salesianas, a dura rotina que faziam as crianças e jovens enfrentarem, mas não trago presente somente o esforço físico diário, e sim, o enfrentamento quanto à proibição do uso de sua língua, que as escondidas, em meios aos sussurros do vento dialogavam, e logo brotava a mais pura risada que deveria ser contida para que não fossem repreendidos, machucados e isolados. A figura feminina, nunca foi vista como ser frágil, pois minha mãe ensinava que não importava o gênero, pois a força está dentro de cada pessoa, e tudo era demostrado em seus atos, bem como, nos kihtí que eram contados nos momentos de partilha ou nos fazeres do dia a dia, como: na ida para roça, na capina, no descascar e ralar a mandioca, seus ensinamentos são cruciais para tornar a mulher que sou hoje e que sabe da importância da nossa cultura.

No ano de 2014, ingressei na Licenciatura em Língua Portuguesa, na Universidade do Estado do Amazonas, onde o Professor MSc. Edilson Martins, do povo Baniwa, foi fundamental para a pesquisa de autoconhecimento linguístico, bem como, uma das disciplinas que tinha como referência o meu tio materno. Esse momento foi muito marcante, pois vê um parente ter prestígio por ser indígena trouxe força para continuar nessa caminhada de autoafirmação. Enquanto era professor assistente, mostrava a cada aluno a importância da valorização cultural, dos Kihtí e de deixá-la registrada. No decorrer da trajetória acadêmica a identidade indígena sempre esteve presente, atualmente, na pós-graduação, ocupar o lugar de fala e escrita, de protagonista, tem se tornando essencial para levar a um outro patamar o modo de vida indígena e as pesquisas relacionados aos povos, podendo o indígena ser o autor e publicizar.

Referências

Povos indígenas no Amazonas. Povos Indígenas no Brasil, 2018.Disponível em:https://pib.socioambiental.org/pt/Categoria:Povos_ind%C3%ADgenas_no_Amazonas. Acesso em: 21 Jun 2022.

São Gabriel da Cachoeira.Wikipédia,2022. Disponível em:<https://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A3o_Gabriel_da_Cachoeira>. Acesso em:22 Jun 2022.


Rosijane Fernandes Moura (29) befindet sich im letzten Semester ihres Studiums der Anthropologie kurz vor dem Abschluss ihrer Masterarbeit an der Bundesstaatlichen Universität von Amazonas (UFAM) in Manaus. Ihr Forschungsinteresse richtet sich auf Wissen und Perspektiven indigener Frauen.

Rosijane Fernandes Moura, Tukano
Mestranda em Antropologia Social- PPGAS/UFAM

English Version

Nũmio Kihtí: To remember is to live, to resist!

In the interior of São Gabriel da Cachoeira, in the Maracajá Community, known as Tuóñariyoã, District of Pari Cachoeira (Imí Sapoeá), Rio Tiquié (Kihsá Ma’a), was where I was born, the third daughter of the union of Ahkutó (Antônio dos Santos Moura) and Yuhsuró (Elza Maria Moura Fernandes), at eleven o’clock on April 27, 1993. Granddaughter of Ku’marõ (Sebastião Moura), belonging to the ethnic group Tukano and Miriõ (Marcelina dos Santos) from the ethnic group Desana and on my mother´s side, Diakuru (Américo Fernandes), Kumu of the ethnic group Desana, and Yusió (Maria Moura), belonging to the ethnic group Tukano.

I am Pirõdyhó, member of the Dipéporõ (Moura Family), ethnic group Ñamiri Mahsã, known as Dahséa, ethnic Tukano. On December 12, 1995 my father died, his death marked the big change in my life, because he had planned with my mother to migrate from the community to the center, São Gabriel da Cachoeira, in search of a better life and school education for the children.
A widow, with three children and pregnant with one more, staying in the community brought obstacles to my mother, the conditions were not convenient for her to stay, particularly in a place where survival depends on great physical effort: hunting, fishing, clearing the field, growing manioc. Therefore, after what happened to my father, she decided to go in search of fulfilling the desire planned by them.

In January 1996, I left the interior with my siblings and my mother to settle in São Gabriel da Cachoeira. The following year, at the Thiago Montalvo School, my school life began, at home my mother taught me what she knew to complete my education. I stayed in this institution for three years, in which, the first year was full of challenges and the attitudes that my classmates had towards me were present in the day to day classes: racism and prejudice for being indigenous and speaking. Laughter during my speech, malicious nicknames and objects thrown at me are the hard memories kept in my mind, which resulted in the inhibition to use my mother tongue, so that I was “accepted” in this environment.

From 2004 to 2007, in the São Gabriel College, the subjects of Portuguese Language, Geography, History and Arts sought to put more value into the importance of the indigenous culture of São Gabriel da Cachoeira, all this due to Law 145/2002, on 22/12/2002, in which the three indigenous languages, Tukano, Baniwa and Nheengatu, were made official. It was during this period that the question of the abandonment of the mother tongue began to flourish. Joining the Federal Institute of Education, Science and Technology of São Gabriel da Cachoeira was a
dream achieved by few, in 2008, this great dream was realized, because among several students I was approved third place. At the institution I got great experiences, such as: being part of the Event Organization of the Fair Agricolina and the Week of Science and Technology, Research Projects, among others. On these occasions, I met people who encouraged me to get to know myself again, in a personal and a social way, as well as valuing the culture that surrounded me; first and foremost the main figure, my mother and my grandfather, Diakuru, author/narrator of the book Desana “The Sacred Mythology of Desana-Wari Dihputiro Porã” and “Bueri Kãdiri Maririye: The Teachings that do not forget”. Sitting around the table, I listened to my mother, Elza Maria, Desana, telling what it was like to live in the boarding school of the Salesian missions, the hard routine that the children and young people had to face. But I do not only bring to mind the daily physical effort, but the confrontation regarding the prohibition of the use of their language, that the hidden ones spoke, in the midst of the whispers of the wind, and then the purest laughter that had to be contained so that they would not be reprimanded, hurt and isolated.

The female figure was never seen as fragile, because my mother taught that gender dit not matter because the strength is inside each person, and everything was demonstrated in her actions, as well as in the kihtí that were told in the moments of shared daily activities, such as: going to the fields, in the weeds, in the peeling and grating of manioc; her teachings are crucial to make the woman that I am today and who knows the importance of our culture.

In 2014, I enrolled for the Degree in Portuguese studies, at the State University of Amazonas, where Professor MSc. Edilson Martins, from the Baniwa people, was fundamental to the research of linguistic self-knowledge; one of the disciplines my maternal uncle had as a reference. This moment was very striking, because seeing a relative haveing prestige for being indigenous brought strength to continue on this journey of self-assertion. While he was an assistant teacher, I showed each student the importance of cultural appreciation, of Kihtí and of keeping it on record. Throughout the academic trajectory, my indigenous identity has always been present. Nowadays, in graduate studies, the meaning of the protagonist and of the place of speech and writing has become essential to take the indigenous way of life and peoples related research to another level – with the indigenous being the author and publicizing.

Translated by Charlotta Leiter, Kulturschock


German version

Nũmio Kihtí: Sich erinnern heißt Leben, Widerstand leisten!

Ich wurde im Landesinneren der Stadt São Gabriel da Cachoeira in der Gemeinde Maracajá,auch bekannt als Tuóñariyoã, im Distrikt Pari Cachoeira (Imí Sapoeá) am Rio Tiquiégeboren, die dritte Tochter aus der Verbindung von Akhkutó (Antonio dos Santos Moura) und Yuhsuró (Eliza Maria Moura Fernandes), um 11 Uhr vormittags am 27. April 1993. Ich bin Enkelin von Ku’marõ (Sebastião Moura), Angehöriger der Ethnie der Tukano, und Miriõ (Marcelina dos Santos) von der Ethnie des Desana, und mütterlicherseits von Diakuru (Américo Fernandes), Kumu [Schamane, Anm. WK] der Ethnie der Desana, und Yusió (Maria Moura), Angehörige der Ethnie der Tukano.

Ich bin Pirõdyhó, Mitglied der Familie Dipéporõ (Familie Moura) der ethnischen Gruppe Ñamiri Mahsã, bekannt als Dahséa, der Ethnie der Tukano. Am 12. Dezember 1995 verstarb mein Vater, sein Tod bedeutete eine große Veränderung in meinem Leben. Er selbst hatte bereits geplant, mit meiner Mutter nach São Gabriel daCachoeira umzuziehen; auf der Suche nach einem besseren Leben und Schulbildung für die Kinder. Als Witwe mit drei Kindern und schwanger mit einem weiteren wäre ein Verbleib in der Gemeinde für meine Mutter mit großen Schwierigkeiten verbunden gewesen. Die Bedingungen wären für ihren Verbleib nicht förderlich gewesen an einem Ort, wo das Überleben vom Einsatz großer physischer Kraft abhängt: Jagd, Fischfang, das Roden der Pflanzen, Anbau von Maniok. Nach dem, was mit meinem Vater passiert war, entschied sich meine Mutter, den Entschluss, den sie gemeinsam gefasst hatten, in die Tat umzusetzen. Im Januar 1996 zogen wir Geschwister und meine Mutter fort und suchten uns eine Bleibe in São Gabriel da Cachoeira.

Im darauffolgenden Jahr wurde ich in der Schule Thiago Montalva eingeschult. Zuhause brachte mir meine Mutter das bei, was sie wusste, um meinen Unterricht zu ergänzen. Ich blieb drei Jahre in dieser Einrichtung, worin das erste Jahr voller Herausforderungen war, die Einstellung meiner Mitschüler mir gegenüber, der Rassismus und die Vorurteile, weil ich Indigene war, das Gelächter tagaus tagein, immer wenn ich den Mund aufmachte, die bösen Namen, die sie mir gaben, die Dinge, die sie nach mir warfen, bis ich schließlich deswegen aufhörte, meine Muttersprache zu verwenden, nur um von ihnen “akzeptiert” zu werden. All dies sind schmerzliche Erinnerungen, die ich mir andiese Zeit bewahrt habe.

Von 2004 bis 2007, am Kolleg São Gabriel, wurde in den Fächern Portugiesisch, Geographie, Geschichte und Kunst zunehmend darauf Wert gelegt, auch die indigene Kultur von São Gabriel da Cachoeira mit einzubeziehen, etwa im Gesetz 145/2002 vom 22.12.2002, wonach auch die drei indigenen Sprachen Tukano, Baniwa und Nheengatú offiziell anerkannt wurden. In dieser Zeit begann ich zunehmend zu hinterfragen, dass ich meine Muttersprache aufgegeben hatte.

Ins bundesstaatliche Institut für Bildung, Wissenschaft und Technik von São Gabriel da Cachoeira aufgenommen zu werden war der Traum von vielen, der aber nur für wenige inErfüllung ging. Im Jahr 2008 wurde dieser Traum für mich Wirklichkeit, unter all denBewerber:innen belegte ich Platz drei. In der Einrichtung machte ich tolle Erfahrungen: Unter anderem arbeitete ich bei der Organisation der Landwirtschaftsmesse mit, bei der Woche von Wissenschaft und Technik, diversen Forschungsprojekten. Bei diesen Unternehmungen lernte ich Leute kennen, die mich dazu anhielten, mich selber wieder kennenzulernen, sowohl persönlich als auch gesellschaftlich, also die Kultur, die mich umgab, wieder wertzuschätzen; allem voran die neben meiner Mutter wichtigste Person in meinem Leben, meinen Großvater Diakuru, Verfasser, bzw. Erzähler der Bücher auf Desana “A MitologiaSagrada dos Desana-Wari Dihputiro Porã” und “Bueri Kãdiri Maririye: OsEnsinamentos que não se esquecem”. Zuhause am Tisch sitzend hörte ich meiner Mutter Elza Maria, Desana, zu, wie es war, im Internat der Salesianer-Mission zu leben, den harten Tagesablauf, den die Kinder und Jugendlichen ertragen mussten. Ich will nicht nur die täglich physischen Anforderungen in Erinnerung rufen, sondern auch, was es hieß, dass die eigeneSprache zu sprechen verboten war, wie sie im Verborgenen miteinander flüsterten wie das Säuseln des Windes, und immer wieder das Lachen aus ihnen herausbrach und sie dann bestraft, geschlagen und eingesperrt wurden.

Die weibliche Person erschien hier nie als schwach, denn meine Mutter brachte mir bei, dass das Geschlecht keine Rolle spiele, denn die Kraft ist im Inneren einer Person und drückt sich in ihren Taten aus, so wie in den kihtí [Mythen, WK], die bei den gemeinsamen Tätigkeiten im Alltag erzählt wurden: Auf dem Weg zur Pflanzung, beim Jäten, beim Schälen und Reiben von Maniok; Lehren, die entscheidendfür mich waren, zu der Frau zu werden, die ich heute bin, und die sich der Bedeutung unserer Kultur bewusst ist.

2014 schrieb ich mich an der staatlichen Universität von Amazonas für Portugiesisch im Lehramt ein, wo Professor Edilson Martins, vom Volk der Baniwa, entscheidend dafür war, sich der eigenen sprachlichen Zugehörigkeit bewusst zu werden; ein Fach, das noch dazu meinen Onkel mütterlicherseits [Jaime Diakara, WK] als Referenz anführte. Ein wichtiger Moment für mich, denn zu sehen, dass einer meiner Verwandten als Indigener Anerkennung genoss, bestärkte mich sehr auf meinem Weg zur Bekräftigung meiner indigenen Identität. Als Assistenzlehrerin zeigte ich jedem Schüler, wie wichtig kulturelle Wertschätzung ist, dieKihtí und ihre Dokumentation. Auf diesem akademischen Weg spielte meine indigeneIdentität stets eine Rolle; im Augenblick, als Post-Graduierte, ist die Bedeutung von Wort und Schrift für mich grundlegend, um so indigenes Leben und die damit verbundenenForschungen als indigene Autorin und Publizistin voranzutreiben.

Übersetzt von Wolfgang Kapfhammer